INCONFIDÊNCIAS

Para apresentação falada: Dirceu (caracteres normais) e Marília (itálicos)

Vejo-te os passos, Marília, tateando o chão dourado desta Vila
Da qual és tesouro, Dirceu,  mais que da vila, da  vida minha
Liberta-te, amor, de grilhão que a alma te prende, atira-te imprudente
Atira-te impensadamente, Dirceu, em meu dilúcido abraço
Seja o lúdico, querida, sempre o lúbrico, mais se proibido
E colha a flor que para ti guardo de perdidas primaveras
Flor que sabe a musgo do mais recôndito paraíso
Vem, Dirceu, por isso, vem sem nada
Vejo pássaros que dançam sob o insólito sol da vila trágica
Paraíso das vagas estrelas de um imponderável crepúsculo
Devoro o que adoro na profana eucaristia de todas as horas
São esse ares, odores, ensejos de amores,  rumores
Porque és isso, nereida e ninfa, a me fazer tonto, exposto, atônito
Maníaco que ataca súbito, veloz, terrífico
Que brilhem teus cabelos na desvirtuosa viagem de todas as brisas
Astro estonteante de galáxias sem órbitas, senhor da aurora
Somente ante minha desdenhosa demoníaca Desdêmona
Veneziano viajante de eras errantes
No incansável encalço do desviante rastro estelar de sideral senhora
Seja meu o mel de teus lábios
Teus lábios teus dentes teu jeito nunca dantes
Dentes que te hão de prender, lábios beijar, jeito que só a  ti se ajeita
Mas erras tão distante, hera de húmus, hímen da terra
Na distância mais íntima, úmida e última das feras
Do homem navegante pelas sinuosas penugens de teus vales
Das montanhas, tamanhas e tantas destas Minas
Pela tua pele, síntese do pêssego
pelos teus pelos que se insinuam sob a túnica de seda
Deusa em mim latejante, voraz, Vênus ante tantos veneranda
Do Venerado Orfeu, são teus harpejos
Toda tua nudez será louvada
Teu canto será benvindo
Faça-te fera, me abata na terra, na mata
Me ama na grama, na lama
Me mata na cama
No chão, na mão
No meio do salão
na mente, ilusão
Dentro do meu coração
Vem, então, morrer comigo
Tira de mim o fatal feitiço que me inspiras
Desfaça a eternidade que me deu a tua lira

Fatal fantasia
Fantasmagoricamente gótica
De um anjo brasílico e barroco
Na Catedral do inconfessável desejo
Ai nave espacial do sonho sem retorno
Ai barco de aventura em mar revolto

Fortuna e virtude
Vício e ventura

Lábios de Marília perfeitos, feitos
flores sequiosas, famintas
Ao jeito de meu beijo famélico
Ciciam por delícias
Em carícias deliro
Suspira sereno em meu peito o supremo desejo
Inspira-me pois o eterno recomeço
Faça de mim pedaço de ti
Volto à semente, devoro o tempo
Devora a mim somente.

Sobre levi

Poeta, ficcionista, ensaísta, sociólogo e professor universitário. Presidente da UBE - União Brasileira de Escritores, diretor do Sindicato dos Sociólogos de S. Paulo e Presidente do IPSO - Instituto de Pesquisas e Projetos Sociais e Tecnológicos. Integra a Coordenação do Movimento Humanismo e Democracia e o Conselho de Redação da Revista Novos Rumos. Foi Presidente da ASESP – Associação dos Sociólogos do Estado de São Paulo, Administrador Regional de Santana -Tucuruvi (SP). Coordenador da Proteção dos Recursos Naturais do Estado de São Paulo. Livros Publicados: Burocratas e Burocracias (ensaio, SP, Ed. Semente, 1981); Ônibus 307 – Jardim Paraíso (poesia, SP, Muro das Artes, 1983); A Portovelhaca e as Outras (poesia, SP, Paubrasil, 1984). O Seqüestro do Senhor Empresário (romance, SP, Publisher/Limiar, 1998); O Inimigo (contos, Limiar – SP, 2003). Recebeu o Prêmio de Revelação de Autor da APCA – Associação Paulista de Críticos de Arte e outros. Publicou diversos artigos, contos, crônicas, poemas e resenhas literárias em coletâneas, jornais e revistas.
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