Começa em Porto Alegre o 8º CBC

Ministro da Cultura Juca Ferreira, Secretário do Audiovisual Newton Cannito, Presidente da Fundacine Cícero Aragon, Presidente da Ancine Manoel Rangel e Presidente do CBC Rosemberg Cariry abrem o evento discutindo mercado, políticas públicas e os novos rumos do setor.

De 12 a 15 de setembro, Porto Alegre se transforma na capital brasileira do Cinema e do Audiovisual. Apesar de clichê, a frase é totalmente verdadeira: até a próxima quarta-feira, dia 15, a capital gaúcha sedia o 8º Congresso Brasileiro de Cinema e Audiovisual, aberto na noite deste domingo (12). Estão presentes no evento mais de 80 entidades das mais importantes do setor, representando nada menos que a totalidade dos estados brasileiros.

A solenidade de abertura do 8º Congresso Brasileiro de Cinema e Audiovisual teve início com a leitura de uma carta enviada pelo cineasta Nelson Pereira dos Santos – Presidente de Honra do CBC – desejando “votos de bons êxitos dos trabalhos”.

Na sequência, o discurso de Cícero Aragon, Presidente da Fundacine, lembrou que nos últimos dez anos os hábitos mudaram de uma forma geral, mas que no segmento audiovisual estas mudanças foram ainda mais radicais: “O mundo não se contenta mais em assistir. Ele quer interagir e participar. Para suprir esta demanda precisamos nos adaptar, crescer juntos. Precisamos pensar em modelos diferenciados, financiar o novo e nos abrir para mercados que se auto financiem. Precisamos ser mais competitivos, agilizar os processos e diminuir a burocracia”. Finalizando, Aragon enfatizou a importância das discussões e debates que o Congresso fomentará nos próximos dias, dizendo: “A partir de agora, estamos em Conclave. E esta agora é a nossa Capela Sistina”.

Em seguida, Rosemberg Cariry, Presidente do CBC, utilizou a linguagem poética para ilustrar as relações entre a atividade audiovisual e o mercado: “Os mestres budistas costumavam dizer que uma coisa é o dedo que aponta a lua e outra coisa é a lua. Sábios eram estes homens. É preciso não confundir o dedo com a lua, nem se iludir com a abstração da lua. Muitas vezes, confundimos o nosso cinema que aponta o mundo com o mundo, da mesma forma que os pequenos macacos muitas vezes se afogam tentando apanhar a miragem da lua refletida na água de um lago. Confundir cinema com mercado é confundir o dedo com a lua. O mercado pode ser importante, muito importante, mas o mercado não é o cinema. Fazer obras tendo como parâmetro exclusivo apenas o possível gosto de um mercado imaginado, em sua abstração conservadora, é se afogar tentando apanhar a miragem da lua refletida na água. O mercado não pode ser um fim em si mesmo, antes deve ser um meio para a realização do homem, da mesma forma que o dedo é um meio que aponta a beleza da lua”. Foi aplaudido em cena aberta.

“Temos que reconhecer: só o sonho é real”
Rosemberg Cariry – Presidente do CBC

Rosemberg afirmou também que “precisamos talvez retomar o sentido mais profundo das palavras pichadas pelos jovens, nos muros de todo o mundo, em maio de 1968 – Sejamos realistas, queiramos o impossível. Por isso mesmo é que precisamos novamente da magia-esperança, da poesia-heresia, do cinema-rebeldia e da alquimia-sonho das palavras e do cinema. Desculpem-me, senhoras e senhores, mas me parece que o povo novo do cinema é exigente, quer muito mais do que o mercado. O povo novo do cinema quer o cinema como pedra filosofal, o ouro como energia espiritual concentrada, da qual falavam os alquimistas em seus sonhos experimentais. Para quem ainda não sabe, me arrisco a avisar: os alquimistas estão chegando, são artífices de todas as tecnologias e convergências digitais, têm entre quinze e trinta anos de idade: são brancos da classe média, são índios da periferia, são negros quilombolas nas favelas das metrópoles, são mulatos rebelados nos shoppings centers, são loiros dos sertões gerais, são caboclos das florestas, são sararás dos terreiros de macumba do planalto central.Um Brasil que se reinventa em cores e sonhos, em novas belezas e impossibilidades tornadas possíveis. O que aqui se reúne é uma nação diversa e unida, nestes tempos de pós-modernidades, em que o centro está em todos os lugares onde estão os homens e as mulheres em seus processos criativos. Temos que reconhecer: só o sonho é real. Sejamos realistas, vamos restituir o sonho ao cinema brasileiro”.

Ao final de sua explanação, Rosemberg Cariry foi aplaudido de pé.

“Já imaginaram Tim Burton colocando projeto em edital?”
Newton Cannito – Secretário do Audiovisual

Manoel Rangel, Presidente da Ancine – Agência Nacional de Cinema – lembrou que há dez anos, também em Porto Alegre, o então 3º Congresso Brasileiro de Cinema acontecia numa situação de grande crise, de redução de público e investimentos, e onde o setor não conseguia dialogar sequer com a Secretaria do Audiovisual. “Com o Ministro da Cultura, então, nem pensar!”. Naquela ocasião, diz Rangel, uma plataforma de 69 itens propostos pelo CBC mudou todo o panorama do audiovisual nacional de dez anos para cá, “porque o CBC se dedicou às grandes pautas, e não às miudezas do cotidiano”.

E conclui, provocativo: “Hoje, dez anos depois, qual será nossa próxima pauta que nos encham de desafios? Esta é a questão central para a qual todos nós precisamos encontrar respostas. Como vamos nos pautar? Quais são nossos desafios?”

Na sequência, Newton Cannito, Secretário do Audiovisual, usou uma linguagem clara e direta para afirmar que o mercado mudou, cresceu, se diversificou e que em função disso tudo “a gente entrou numa sinuca de bico porque agora temos que fazer muito mais do que conseguimos”. Cannito acredita que o audiovisual brasileiro necessita urgentemente pensar num sistema melhor que os editais: “Hoje a burocracia é tamanha que o cinema brasileiro financia a indústria de fotocópias”, ironiza. “Hoje obrigamos todos os produtores a serem políticos, o que não é normal. Já imaginaram o Tim Burton colocando projeto em edital? E obrigamos também todos os cineastas a serem produtores, o que também não é normal. Não estamos valorizando os criadores, mas apenas valorizando quem consegue produzir. O cineasta tem que pensar em arte, não em inscrever filme em edital”, afirma.

Cannito defende que “o problema principal é fazer as pessoas se encontrarem, conversarem, e criarem projetos juntas. Resolver a questão da tecnologia é fácil”. Para o Secretário, a principal questão da chamada “Convergência” está intrínseca na própria palavra: “ver gente”.

É preciso que o cinema deixe de ser visto como uma complementação de uma visita ao shopping center”.
– Juca Ferreira, Ministro da Cultura.

Para Cézar Prestes, Secretário Estadual da Cultura do Rio Grande do Sul, representando a governadora Yeda Crusius, o mercado é importante, mas não pode interferir na criação artística. “Não podemos perder a essência, não podemos nos esquecer que o cinema é orgânico, é verdadeiro”, afirmou.

E Paula Alves de Souza, Chefe da Divisão de Promoção Audiovisual do Ministério das Relações Exteriores, informou que “o Itamarati sempre usou o cinema como alicerce para a política externa”.

A noite de abertura do 8º CBC foi encerrada com a fala do Ministro da Cultura, Juca Ferreira: “Visualizo a imensa necessidade de avançar muito. Não é hora de acomodações, pelo contrário. Essa batalha, guerra, odisseia pelo cinema brasileiro é fundamental”.

Ressaltando que “Mercado não é só mercadão. A quitanda da esquina também é mercado”, Ferreira propõe um “armistício entre o cinema artístico e o cinema comercial, pois o Brasil vive um momento de possibilidades imensas. O Brasil precisa se ver nas telas. Todas!”.

Concluindo, Juca Ferreira afirmou que “é preciso que o cinema deixe de ser visto como uma complementação de uma visita ao shopping center”. E que “a demanda futura será tamanha que tudo o que está sendo feito ainda é pouco”.

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